Por Jacinto Júnior – A QUEM INTERESSA UMA PÉSSIMA EDUCAÇÃO?

Jacinto Júnior

Hoje o movimento é imperceptível.

Os filhos estão mortos.

O povo adormecido.

(Pedro Tierra).

Há em curso uma intensa movimentação dos setores dominantes encastelados no Congresso Nacional através de seus deputados venais para fortalecer o discurso da falência do sistema educacional brasileiro e, com isso, a disseminação ideológica de que a educação forte e de boa qualidade se encontra nas prateleiras das escolas privadas. A mercantilização da educação vai gerar um segmento cultural cada vez mais restrito no que concerne ao acesso à educação, ao saber e ao conhecimento científico, pois, ela estará à venda no mercado e só quem vai compra-la serão os filhos dos barões.  

 É quase impossível aperceber-se da tática formulada pelo pensamento liberal/conservador visando modificar a notação educacional como bem coletivo para a concepção privada do sistema educacional brasileiro. Do mesmo modo, isso trará consequências funestas para uma significativa parcela dos educandos pertencentes à classe popular, por isso, podemos falar de ‘morte’ dos filhos dos trabalhadores no campo educacional. Podemos verificar três aspectos essenciais sobre a estratégia da elite liberal para abocanhar esse fabuloso mercado, a saber: Primeiro é visível a insensibilidade do governante em relação à qualidade do ensino público e seu consequente investimento.  Segundo é possível constatar a dormência intelectual dos educandos por conta das condições materiais das escolas públicas. E, terceiro, o engessamento social da comunidade, parecendo que houve aplicação de uma injeção letal contendo densa anestesia. Portanto, há uma evidência disso, quando se foca a questão de mobilização. O movimento popular perdeu-se e, ao perder-se perdeu o sentido histórico de sua missão revolucionária: combater organizadamente as injustiças sociais e contribuir para o bem-estar de si e de todos.

A lógica que integra a ideologia liberal impulsiona de forma objetiva a separação e a desintegração dos movimentos sociais em todas as partes e setores nucleares. A realidade que estamos testemunhando é um exemplo clássico dessa articulação em que os setores dominantes propondo-se como estrutura social harmoniosa. O conceito-chave de ajuste social tende a eliminar a resistência tanto de movimentos sociais independentes quanto de sujeitos organicamente inalienados. Para a ideologia liberal a formula perfeita é o absoluto controle do mercado e do modo de pensar de cada homem. Pois isto se concatena com o discurso moralizante da meritocracia. A meritocracia é, sumariamente, o componente fundamental para quebrar e aniquilar – literalmente – a relação social entre sujeitos históricos, pois, o princípio que coordena seu movimento se sustenta na eliminação do outro e, isto, sob quaisquer formas. Neste sentido, há uma evidência concreta de que o conceito meritocracia fere a dignidade do outro sub-repticiamente.   

Quando verificamos modelo dessa envergadura, logo, teremos um conceito-chave e determinante para o sistema funcionar perfeitamente: a alienação global.

A investida do liberalismo é frontal em relação ao estado nacional: é necessário demoli-lo em sua base funcional e inverter a lógica econômica, cujo principio, tem na liberdade individual sua máxima teórica para a consolidação do regime concorrencial e excludente.

Deixemos de lado os aspectos teórico-ideológicos do liberalismo clássico para retornarmos ao ponto central desse pequeno texto, cujo título é: a quem interessa uma péssima educação?

Os substratos do Estado Democrático de Direito impõe ao poder público, em suas respectivas esferas, a responsabilidade de oferecer educação básica de qualidade a todo(a) cidadão(ã) que deseja estudar e aprender a aprender. Tal princípio tem sido ao longo do tempo, especialmente, a partir da promulgação da “Constituição Cidadã” (1988) negado e/ou subnegado. Isto é, os gestores públicos irresponsáveis deixam de promover a valorização do Magistério Público e, paralelamente, reduzem o investimento necessário e vital para a construção de um processo educacional de qualidade e com equidade social à quem fundamentalmente necessita dessa política social.

Quando olhamos para a crise candente educacional sentimo-nos desencorajados a continuar lutando por sua efetiva qualidade e equidade. Contudo, emerge, subitamente, de nossa alma a esperança imorredoura, o espírito inabalável que ilumina nossa caminhada pelejando por renovadas conquistas e amplas vitórias. O homem comprometido com uma causa nobre jamais abdica de sua paixão infinita de contemplar seu sonho se tornar realidade cedo ou tarde, por isso, vale a pena lutar, não importando se está só, ou acompanhado!  

A educação de qualidade e com equidade social constitui o eixo elementar para desembocar na inadiável mudança estrutural que, direta e, inquestionavelmente,  impulsionará o desenvolvimento integral e permanente de nossa nação. É impensável propor alguma alteração em qualquer setor de uma determinada estrutura, se não for por intermédio de um processo educacional. Isto porque o sujeito letrado domina os elementos básicos de um processo, de um projeto. Ele é dotado de inteligência, inteligência essa desenvolvida na escola; aliás, na escola foi onde ele a aperfeiçoou. Por conseguinte, a educação é a base de uma transformação radical do homem. O homem que possui conhecimento pode contribuir para mudar alguma realidade social, dependendo, claro, de sua determinação e vocação.

A partir dessa situação, pergunto: a quem interessa uma péssima educação?

Concretamente, precisamos desanuviar o discurso prevalente que circula no meio da comunidade educacional de que o sistema educacional como um todo é complexo. Ou, então, a velha anedota preconizada por gestores de que os recursos financeiros são insuficientes e que está fazendo das “tripas coração” para oferecer o melhor na educação. Caramba, isso é que dá, quando a sociedade opta por um governante completamente descompromissado para com a educação em particular e para com o município genericamente. 

Quais os pontos nodais que são convergentes para o completo desinteresse do gestor em relação à uma educação de qualidade e com equidade social?

Podemos enumerar alguns eixos:

  1. A alimentação escolar é uma política pública que integra o sistema educacional. É práxis de o governante institucionalizar a cultura da temporalidade dos alimentos sazonais (parece que só existe aquele produto) que, assim mesmo, não atende por inteiro a demanda estudantil. A lógica da distribuição da alimentação escolar é periódica (isto é, alguns dias sim, e outros, não) e não sistêmica, como deveria ser;
  2. Material de expediente e permanente. As unidades escolares padecem com a ausência desse material. Na maioria das unidades escolares o material é insuficiente para atender a demanda interna. O profissional da educação solicita ao educando que compre ‘xamequinho’ para fazer as tarefas e atividades-fins;
  3. Salas multifuncionais. A questão do AEE – Atendimento Educacional Especializado – é crucial para incluir os alunos com as diversas deficiências com um profissional competente, estimulado e comprometido com sua tarefa pedagógica, entretanto, esse item não faz parte da ampla maioria das unidades escolares e nem profissionais da área para atender a demanda;
  4. Sala de informática. Todas as unidades escolares já deveriam ter laboratórios de: informática, de Ciências e de Matemática, além de uma Oficina Pedagógica com o intuito de elaborar e construir material alternativo visando melhorar o processo ensino-aprendizagem. As unidades escolares também já deveriam ter Banda Larga. Pelo que consta o governo federal já determinou que as escolas da zona rural também fossem contempladas com a Banda Larga e, o fato concreto, é que ainda para algumas unidades escolares o período é analógico;
  5. Material didático e pedagógico. Esse velho dilema transparece como a um filme repetido dezenas e centenas de vezes. E continuará a ser um entrave para o desenvolvimento dinâmico dos educandos e educadores, pois, não há uma política de aquisição permanente desse material e que atenda o sistema completamente;
  6. Poucas unidades escolares oferecem tal oferta. Aquelas que oferecem se utilizam de salas de professores ou o espaço reduzido do almoxarifado.
  7. Transporte escolar. O Programa Caminho da Escola oferece excelente oportunidade para o município adquirir sua frota e, assim, promover justiça ao educandos que residem fora do perímetro urbano e ser tratado com mais dignidade.
  8. Instrumento extremamente importante para a escola desenvolver suas tarefas e atividades com os recursos designados e, para continuar a recebê-los de modo sistemático é fundamental que a gestão escolar mantenha em dia sua contabilidade. Caso contrário, enfrentará um duplo problema: prejudicará o desenvolvimento da escola e a gestora ser notificada pelo TCU.

Quando um gestor sente o peso da responsabilidade em realizar uma administração proba, certamente, o município é que vai ganhar. Aliás, o gestor público que toma para si o compromisso de implantar uma administração séria, aberta, popular, democrática e, sobretudo, transparente, terá sua história inscrita na posteridade como registro indelével de como gerenciar a res pública. Porém, ao inverso, seu nome será constipado e ao ser lembrado será como o pior que a história registrou.  

Portanto, eleger a educação como prioridade é um ato de justiça e bom senso. Ganha o povo, ganha a sociedade, ganha o desenvolvimento; ganha a liberdade que manifesta sua imparcialidade com força esplendorosa.

A um só setor interessa a péssima educação: ao mercado privado. Enquanto houver um representante do povo governando um município fingindo investir na educação, tanto mais feliz fica o mercador da educação privada, pois, a tendência é açambarcar a clientela que não mais deseja o ensino público por sua precariedade. Além do mercado, outro aspecto negativo produzido pela ineficiência do sistema público de ensino é a crescente taxa de analfabetismo. Informações da SEMECTI dá conta de que há uma parcela de nossa população em torno de 30% que ainda não alcançou esse bem público. Essa realidade se constitui num drama para o futuro de nossa cidade, pois, a tendência é o engessamento do sistema comprometendo o desenvolvimento das forças produtivas – diria material e intelectual.

O maior crime que um determinado gestor comete contra seu povo é quando ele abandona o eixo educação. Por isso, o poeta Pedro Tierra nos alerta sobre a imperceptibilidade do movimento, a morte do futuro e a dormência fulminante alijando o povo de sua cidadania.